MÚSICA, CRIAÇÃO DIVINA ETERNIZADA PELO HOMEM - LUIS de Sousa Santos

MÚSICA, CRIAÇÃO DIVINA ETERNIZADA PELO HOMEM


Luis de Sousa Santos[1]


RESUMO

A música é um substrato de ervas alucinógenas retirada de plantas cultivadas em canteiros do Monte Olímpio. Algo que os Deuses ajuntadamente, na genialidade de suas energias divinas, conceberam para a humanidade, arte liberal e nobre visando uma perfeita ordem do cosmo. Não permitiram, no entanto, a entrada na sua constituição íntima sob o perigo de violar a sua essência e fosse sabotada pela ganância inconsequente dos humanoides. Porém, concebeu-a em caráter ecumênico, coletivo e universal com a possibilidade de ser utilizada por todos sem disposição de qualquer natureza. O homem torna-se, então, o artesão, o paridor ou intermediador, cedendo sua placenta entre a vontade do ser supremo e a materialização do som em toda a sua plenitude e musicalidade.  Enfim, tomemos a habilidade e talento concedido, para servirmos de embaixador do processo de “crear” e oferecer como deleite, ciência, educação, medicina, prevenção, reabilitação e cura.


Palavras-chave: Música; Musicoterapia; Seres vivos; Educação; Medicina; Cura.



                                                                                       
INTRODUÇÃO


Idade em que o tempo se esquece, o homem sempre procurou incansavelmente a cura e salvação para as moléstias do corpo, mente e espírito, alumiados por suas crenças, religiosidade e os poderes descobertos das ciências. Acreditava-se que os males lançados sobre os corpos advinham da fúria silenciosa dos Deuses ou espíritos irritados com os desvios de conduta do ser humano e seu desequilíbrio na sua vivencia terrena. Os descuidos ou mesmo transgressão de preceitos normas e devaneios.
Colaborando nesse contexto, Clarice Moura Costa, em “O despertar para o outro” (1989, p. 17 e 18) diz:
Na tentativa de submeter as forças que dominavam a natureza à sua vontade, para proteger-se dos perigos sobrenaturais, o homem desenvolveu procedimentos especiais, a fim de entrar em contato com espíritos, procurando influenciá-los para atrair suas bênçãos ou evitar sua ira.

A estrada do tempo vai cozendo rumos e os problemas da humanidade se materializando, crescendo como o ciclo da lua: minguante, crescente, cheia,  chegando às novas e modernas apresentações de malefícios incompreensíveis e imensuráveis. Geminados, não sabemos pois, guiados não sabemos como,  por arpão e ira demoníaca punitiva.
A posição de Rolando Benenzon, no livro “Manual da Musicoterapia” (1988, p. 165), acrescenta:
O uso da música para se combater enfermidades é quase tão antigo como a música em si; porém os primeiros escritos onde se faz referencia à sua influencia sobre o corpo humano são provavelmente os papiros médicos egípcios descobertos em Kahum, por Petrie, em 1899 e que datam por volta de 1500 antes de Cristo. Uma citação bíblica (SAMUEL, 16:23) diz: “Quando o mau espírito de Deus se apoderava de Saul, David tomava a harpa, a tocava, e Saul acalmava-se e se sentia melhor e o espírito mau afastava-se dele.”

A música era utilizada pelos povos primitivos para afastar maus espíritos, receber bênçãos dos Deuses, chamar entidades de cura, homenagear a natureza, clamar a chuva, aplacar a ira dos trovões e relâmpagos de fogo, afastar o mau dos enfermos e expulsar os demônios.
Apreciemos a reflexão de Benezon, no Manual de Musicoterapia (1985, p.169):
Aristóteles falava do verdadeiro valor médico da música ante as emoções incontroláveis e atribuía seu efeito benfazejo para a catarse emocional. Platão receitava música e dança para os terrores e as angústias fóbicas. Zoroastro recomendava a seus alunos que começassem e terminassem as jornadas de estudos com concertos, porque o movimento doce e medido da música  fazia com que a alma entrasse no silencio dos sentidos, sendo esta igualdade e este equilíbrio necessários para as investigações aprimoradas.

A utilização de música na primeira e segunda guerra mundial foi importante na reabilitação de doentes, enfermos e dilacerados por armas de fogo, com efeito relaxante e sedativo. Apurando os valores benéficos e poderosos desse ópio alucinante chamado música, acolhemos esse fenômeno divinal que penetra no corpo e na alma por dutos incompreensíveis, alcançando resultados e efeitos vibrantes com possibilidade histórica de mudar a humanidade.


MÚSICA E TERAPIA


Temos a sensação de que os dias estão mais curtos, as semanas acabam como o apagar de uma luz, os espaços mais encolhidos e sufocados, as relações humanas se distanciando ao extremo, as tecnologias, que supostamente viriam para proporcionar um bem estar, parecem não cumprir sua missão. Os transportes ajudam pessoas e matam mais, o homem que antes se unia para se defender dos bichos e aplacar o frio, hoje se engradam em fortalezas para se defender dos da sua espécie. O mundo em conflito.
Neste seco cenário em ebulição, parecem, as cidades, não ser o melhor lugar para se viver. Enriquece as doenças e aumentam as más condições de saúde das pessoas.  Enfim, acompanhando esse caos urbano, acrescentam-se fortes ocorrências de distúrbios, doenças das metrópoles a exemplo da demência, ansiedade, depressão, estresse e psicose.
Neste panorama atual apoiado pelos meios de disseminação existentes, a música irradia de energia e luz as casas, as praças e as ruas, penetra no cinema, no rádio e televisão. A música atinge áreas do nosso cérebro que droga nenhuma nem choque elétrico conseguem alcançar. São frequências sonoras e sensações quase imperceptíveis que nos faz reagir inconscientemente de maneira muito emocional.  Emergem à flor  desejos latentes e sensações indutoras de regressão, alcançam pessoas ausentes como os autistas, proporciona uma gratificação pessoal, alcançando suas funções sintetizadora, integradora  e hipnótica em um plano harmônico. Música é movimento e por si, representa um desafio no tempo e no espaço. É o domínio das resistências e possibilidades de evocar a mente e o espírito na busca do equilíbrio da consciência.
Na visão de Ana Léa, em “Musicoterapia: uma visão geral” (1999, p.10),
Na musicoterapia utilizamos esses efeitos que a musica pode produzir nos serem humanos nos níveis físico, mental, emocional e também no social, atuando como um facilitador da expressão humana dos movimentos e sentimentos, promovendo alterações que levam a um aprendizado, uma mobilização e uma organização interna que permitam ao individuo evoluir em sua busca, seja ela qual for.

Pessoas com amnésia conseguem repor lembranças esquecidas, outras produzem mais quando trabalham sob o efeito de musicas. Artistas cantadores arrastam multidões ao seu entorno provocando vibrações de felicidade, êxtase, delírio e louvor. É o poder incomensurável e ecumênico de uma relação cíclica entre o espírito, a música e o sujeito.




REFLEXÕES SOBRE UM ACOMPANHAMENTO DE CASO

Desde o ano de 2004, época em que fui morar na zona rural da cidade de Teresina, a 10 km da capital.  Por necessidade, proteção e segurança, adotei vários cachorros de raças diversas, bem misturados.  À noite, quase que diariamente, num amplo terreiro que abraça a casa, fico tocando e cantando ao violão, canções populares nordestinas, cirandas, toadas, reisados, etc. O público alvo ou plateia cativa são treze cães e um jumento, elementos que integram esse  convívio.  Como forma de acentuar o poder do som musical sobre todos os viventes do planeta, apresento aqui um relato, experimental-observativo, num laboratório natural e espontâneo desse ecossistema.  O fato é evidente e real. É desafiadora essa possibilidade de estímulos sonoros musicais atingirem esses animais num processo de comunicação. Lógico, parece um pouco complicado, porém necessitam de mais estrutura referencial para serem compreendidos.
Na ausência da música eles ficam de pé, agitados, ora brincando entre si, ora correndo pro mato, sempre atentos a qualquer movimento e barulhos que ressoa seu instinto de defesa.  Ao ouvir as melodias das canções, todos deitam acomodados ao chão e permanecem de olhos fechados, calmos e quietos.  Propositalmente, para observar suas reações, paro a música. Todos indistintamente, em ondas seguidas, levantam a cabeça em direção a fonte sonora como se  reclamasse a interrupção.  Ficam relaxados quietos e deitados quando ouvem novamente as canções.  Noutro momento, quando interrompo a música por um intervalo mais longo, voltam eles ás suas atitudes normais brincadeiras, mordidas, grunidos e latidos de ocupação territorial.
 O jumento, que normalmente vive mais pra dentro das matas, quando escuta o som da viola vem correndo em trote rápido em direção à fonte sonora, cola suas grandes orelhas à caixa acústica do instrumento, fica em pé, sereno e de olhos fechados mascando.  Balança o rabo e abre os olhos sempre que a música se acaba. Quando paro a música por um longo intervalo todos os animais se dispersam e voltam às suas atividades instintivas.
Ainda neste cenário, na parte da manhã por volta do meio dia, trago para o terreiro um par de bongô – instrumento membranofône composto por dois pequenos tambores unidos entre si, afinados em alturas diferentes, um mais grave do que o outro. Começo a percutir ritmos variados, batidas espontâneas, sem seguir métrica. No chão, coloco vários pedaços de banana em relotas. Como por encanto, logo o terreiro fica todo esverdeado com a presença de dezenas de camaleões – lagarto verde que possui o mimetismo de mudar de cor quando se sentem ameaçados.  Nesta ação, música é alimento! Há uma evidencia crescente de que a pratica desse canal de comunicação fez a aproximação entre o homem e o animal através da música.  Quando não ha música, não há aproximação, mesmo tendo a comida. Eles não chegam perto da casa sem esse chamamento.  A existência dessa condição é necessária para que ocorra essa reação. Existe uma clara conveniência afetiva, associada à música, que norteia esse comportamento.  Na biologia poderíamos chamar de comensalismo.  E fático esses impulsos ou reações claramente refletidas pela necessidade básica de se alimentar, mas conduzidos pelo contexto da musica.
Observando: no caso dos cães, a música é a necessidade.  Diferente dos camaleões, aonde a música  conduz ao alimento. Essa percepção, fora do romantismo, coloca a música como uma espécie universal de terapia necessária para qualquer espécie de ser vivo animal ou vegetal.
Considera, Even Ruud, no seu livro Caminhos da Musicoterapia (1990, p. 19), que:
Cada vez que tentamos afirmar algo a respeito desse mundo ou da música, estamos criando ou recriando o mundo. Estamos construindo o mundo através da representação de nossas sensações dentro de nosso sistema de linguagem culturalmente obtido.

 A referência é o efeito da audição da música e sua influencia nesses impulsões sensoriais despertados por esses animais “irracionais”.  O fato é que esse procedimento acústico comprova, mesmo circunstancial, que atingiu algum domínio atrativo e poderoso, um meio para atender as necessidades e gratificação do resultado. A função da música nesse contexto é que ela serviu como veiculo de comunicação e expressão entre o prazer de ouvir - pelos cães - e o prazer de se alimentar dos camaleões. Tenta-se mostrar a maneira como essa ferramenta pode criar reações e os mecanismos de satisfação animal.  Isso revela como a música é compreendida em seus próprios termos - com frequência e amplitude – e produzem reações positivas em todas as raças de gente e de bicho.




REFERÊNCIAS

BENENZON, Rolando O. Manual de musicoterapia. 3. ed. São Paulo: Summus, 1988.

__________. _________. Rio de Janeiro: Enelivros, 1985.

COSTA, Clarice Moura. O despertar para o outro: musicoterapia. São Paulo: Summus, 1989.

RUUD, Even (org.). Música e saúde. São Paulo: Summus, 1991.

_____. Caminhos da musicoterapia. São Paulo: Summus, 1990.

VON BARANOW, Ana Léa Vieira Maranhão. Musicoterapia: Uma Visão Geral. Rio de Janeiro: Enelivros, 1999.




[1] Graduado em Educação artística – habilitação em Música, pela Fundação Universidade Federal do Piauí – FUFIP; Especializando em Musicoterapia; Cantador, tocador e criador de canções regionais nordestinas; Funcionário do Banco do Brasil S.A.

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